Por Marcelo Zurita*

As imagens foram gravadas às 23h03 dessa sexta (11) nas estações RCP2 e RCP3 administradas pelo Renato Poltronieri em Nhandeara, São Paulo. Além disso, a reentrada também foi registrada por uma câmera do Clima ao Vivo em Monte Azul Paulista, e pelo internauta Fernando Palhares, de Jales, também de São Paulo. Confira os vídeos:

 

A partir das imagens registradas em Nhandeara e Monte Azul Paulista, aBramon calculou a trajetória dos detritos na atmosfera. As imagens, entretanto não mostram o início nem o fim da trajetória, uma vez que essas câmeras são programadas para não gravarem objetos sem movendo lentamente, como o que ocorre em reentradas. Quando iniciou a gravação, os satélite já estava completamente fragmentado, passando sobre Paranaíba, Mato Grosso do Sul. Os fragmentos seguiram lentamente na direção sudeste. A gravação foi interrompida quando eles passavam sobre o município paulista de Lins.

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Trajetória Calculada para os Fragmentos. Créditos:Bramon

A trajetória calculada para a trilha de detritos é totalmente compatível com a esperada para o satélite Starlink-32, cuja reentrada estava prevista para às 22h34 com margem de erro de 1 hora, segundo a previsão de Joseph Remis, especialista em cálculos de reentradas.

 

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Predição da posição do Starlink-32 no horário da reentrada. Créditos: satflare.com

 

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Previsão da reentrada calculada por Jseph Remis


Starlink-32

O Starlink-32 é um satélites da Constelação Starlink, da SpaceX. Ele foi lançado em 24 de maio de 2019 a partir de Cabo Canaveral, em um foguete Falcon-9 também da Space-X. Foi o primeiro lançamento da empresa norte-americana a colocar em órbita 60 satélites de uma só vez. O objetivo da SpaceX é criar uma constelação com 12 mil satélites que fornecerão acesso a internet de alta velocidade para todo o planeta.

Depois de colocado em órbita, o Starlink-32 passou a apresentar problemas e foi manobrado para reentrar na atmosfera, o que ocorreu sobre o Brasil, na noite de sexta, 11 de setembro.

 

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Satélite Starlink em órbita. Créditos: SpaceX

 

Reentrada sem riscos para a população


Um satélite permanece em órbita da Terra quando há um equilíbrio entre a força da gravidade e a força centrífuga gerada pela velocidade inercial do objeto. Para colocar um satélite em órbita, é preciso lançá-lo a uma velocidade de pelo menos 28 mil km/h. Velocidades mais elevadas, implicam em órbitas mais elevadas, e velocidades mais baixas, órbitas mais baixas. Logo, para retirar os satélites de órbita, são realizadas manobras para reduzir suavemente sua velocidade.

A medida que o satélite vai assumindo órbitas mais baixas, ele começa a encontrar algumas moléculas de gases da alta atmosfera. Ao atingirem o satélite, essas moléculas produzem um arrasto, que mesmo muito pequeno, vai reduzindo gradativamente a velocidade do satélite. Isso vai levando-o para órbitas cada vez mais baixas, com uma densidade atmosférica cada vez mais alta, que produz cada vez mais arrasto.

A uma altitude entre 120 e 100 km, dependendo das condições atmosféricas, o impacto das moléculas com o satélite começa a produzir calor, gerando uma bolha de plasma em torno da estrutura. O satélite literalmente acende como uma lâmpada.

A cerca de 80 km de altitude, o arrasto imposto pela atmosfera começa a destroçar todo o objeto e seus componentes são submetidos a um aquecimento considerável que causa a incineração da maior parte da estrutura do satélite. O calor e as pressões geradas pela alta velocidade desintegram rapidamente as partes mais frágeis da estrutura. Apenas algumas peças maiores, fabricadas com ligas metálicas mais resistentes ao calor, sobrevivem ao processo de reentrada. E no caso das Starlinks, as chances são mínimas.

 

 

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Propulsores iônicos dos satélites Starlink. Créditos: SpaceX

 

Com apenas 227 kg, um satélite Starlink parece ser bastante frágil. Composto basicamente de uma fina estrutura metálica que abriga seus instrumentos e grandes painéis solares. Dessa forma, provavelmente grande parte de sua estrutura, senão toda, foi completamente desintegrada durante a reentrada na atmosfera. Apenas três pequenos propulsores iônicos com cerca de 10 cm, que são feitos de material um pouco mais resistente, podem não ter se desintegrado. Ainda assim, são peças muito pequenas e não trazem qualquer risco para a população em solo. Podemos então dizer que a reentrada do Starlink-32, apesar do susto, não passa de um belo espetáculo no céu.


Marcelo Zurita é presidente da Associação Paraibana de Astronomia – APA; membro da SAB – Sociedade Astronômica Brasileira; diretor técnico da Bramon – Rede Brasileira de Observação de Meteoros – e coordenador regional (Nordeste) do Asteroid Day Brasil