[Atualizado às 15h50 com o posicionamento completo de Jair Bolsonaro]

Segundo uma reportagem publicada nesta quinta-feira, 18, no jornal Folha de S.Paulo, empresários pagaram serviços de disparo de mensagens em massa para espalhar conteúdo contra o Partido dos Trabalhadores através do WhatsApp.

A prática, se comprovada, pode ser considerada ilegal por configurar doação de campanha por empresas privadas e não declarada – também conhecido como “Caixa 2”. Existe a possibilidade de que muitas dessas mensagens sejam de notícias falsas.

A reportagem da Folha, assinada pela jornalista Patrícia Campos Mello, apurou que as empresas, entre elas a rede de lojas de departamento Havan, pagaram até R$ 12 milhões em cada contrato com serviços de disparo de mensagens em massa.

Os serviços teriam sido oferecidos pelas agências Quickmobile, Yacows, Croc Services e SMS Market, entre outras. Cada mensagem custa entre R$ 0,08 e R$ 0,40, dependendo da origem dos números de telefone que serão alvo da campanha.

O objetivo da ação era denegrir a imagem do PT e, consequentemente, do candidato do partido à presidência da República, Fernando Haddad. E, desta mesma forma, apoiar Jair Bolsonaro (PSL), oponente de Haddad na disputa pelo Planalto.

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Os números de telefone que receberam as mensagens contra o PT diretamente destas quatro agências vieram de duas formas: números oferecidos voluntariamente pelos apoiadores e eleitores de Bolsonaro e por bancos de dados de terceiros.

O uso destes bancos de dados também fere a lei eleitoral. São relações de nomes, endereço e outros dados de pessoas que podem ter sido vazados pelas redes sociais, por empresas de cobrança ou de forma ilegal por funcionários destas mesmas empresas.

De posse destes dados de terceiros, as agências de disparo de mensagens podem segmentar o público-alvo: por exemplo, mandar material de campanha só para pessoas de uma determinada região, idade e classe social.

Nenhuma das quatro agências aparece na prestação de contas que a campanha de Bolsonaro forneceu ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE). A única empresa do tipo que aparece na relação é a AM4, uma agência que diz ter recebido R$ 115 mil para cuidar das mídias digitais do candidato.

Não há indícios de que a empresa tenha fechado contrato para disparo de mensagens em massa. Mas a Folha apurou que a AM4 utilizou de ferramentas como o TextNow para gerar números de telefone falsos e, assim, participar de mais grupos de conversa no WhatsApp e driblar as restrições de encaminhamento do app.

O que dizem os acusados

Luciano Hang, dono da rede de lojas Havan e notório apoiador de Bolsonaro, disse à Folha que “não sabe o que é” disparo de mensagens em massa por WhatsApp. “Não temos essa necessidade”, disse ele. “Digamos que eu tenha 2.000 amigos. Mando para meus amigos e viraliza.”

A QuickMobile disse que não está trabalhando em disparo de mensagens em massa sobre política neste ano, que seu foco é em mídia corporativa e que não fechou contrato do tipo com qualquer candidato. A Yacows disse que não vai se manifestar sobre o caso e a SMS Market não atendeu à reportagem da Folha.

A AM4, única empresa do ramo que aparece na prestação de contas de Bolsonaro, negou que esteja criando números falsos para driblar as regras do WhatsApp e disse apenas que seu trabalho se restringe a administrar grupos oficiais de campanha do candidato no aplicativo.

Jair Bolsonaro não se manifestou oficialmente sobre o caso. Pela manhã, o candidato, porém, compartilhou em seu Twitter um post do filho, Carlos Bolsonaro, vereador no Rio de Janeiro, em que ele chama a Folha de “Foice de SP” e acusa o jornal de “contar meias verdades ou mentiras descontextualizadas”.

Mais tarde, ele compartilhou outro post pelo Twitter em que um seguidor diz que “Haddad espalha fake news”. Bolsonaro também afirmou na rede social que “apoio voluntário é algo que o PT desconhece e não aceita” e que “o PT não está sendo prejudicado por fake news, mas pela verdade”.

Ao site O Antagonista, Bolsonaro acrescentou: “Eu não tenho controle se tem empresário simpático a mim fazendo isso. Eu sei que fere a legislação. Mas eu não tenho controle, não tenho como saber e tomar providência. Pode ser gente até ligada à esquerda que diz que está comigo para tentar complicar a minha vida me denunciando por abuso de poder econômico”.

Bolsonaro e WhatsApp

Na última semana, Bolsonaro também fez críticas às regras de compartilhamento de mensagens no WhatsApp. Desde julho, o app restringiu o número de chats para os quais uma mesma mensagem pode ser encaminhada, de 250 para 20.

“Quem não ficou chateado quando o WhatsApp, dizendo que era para combater crime de ódio, em vez de [permitir] você passar mensagens para 200 e poucas pessoas passou para 20? Nós vamos lutar para que volte ao que era antes”, disse Bolsonaro numa transmissão ao vivo feita pelo Facebook na última sexta-feira, 12.

A medida do WhatsApp foi criada para combater as notícias falsas. A mudança foi implementada logo após uma crise na Índia virar manchete no mundo todo: em questão de dias, mais de 20 pessoas morreram em linchamentos motivados por correntes e boatos que foram espalhados pelo aplicativo.

Além disso, em julho de 2017, o então deputado federal Jair Bolsonaro apresentou um projeto de emenda à constituição para garantir que apenas o Superior Tribunal Federal pudesse ordenar que o WhatsApp fosse bloqueado. Entre 2015 e 2016, o app parou de funcionar três vezes no Brasil por decisões judiciais de instâncias mais baixas.

A PEC já percorreu todos os trâmites na Câmara dos Deputados e, em dezembro de 2017, obteve parecer favorável da Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania. Desde então, o projeto aguarda votação no plenário do Parlamento.

Indústria das fake news

Não há como saber se as mensagens promovidas pelos empresários pró-Bolsonaro são só de informações verdadeiras ou se há no meio também notícias falsas. Fato é que as fake news têm sido fortemente espalhadas através do WhatsApp nestas eleições, de todos os lados da disputa.

O vice-procurador-geral Eleitoral, Humberto Jacques de Medeiros, disse recentemente que o Ministério Público está apurando a existência de um possível esquema “industrial” de compartilhamento de fake news pelas redes sociais.

“A lei eleitoral fala que contratar alguém para difundir na internet propaganda negativa é crime”, disse ele, segundo o UOL. “O que é preocupante é quando você tem um esquema industrial de produção de mentira com uma propagação artificialmente impulsionada. […] É isso que está sendo investigado em alguns casos.”

O que diz o WhatsApp

Na última quarta-feira, 17, Chris Daniels, vice-presidente do WhatsApp e ex-vice-presidente do Facebook responsável pelo Internet.org, publicou um extenso artigo na mesma Folha de S.Paulo para defender o WhatsApp e suas ações contra as fake news.

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“Hoje, mais de 90% das mensagens enviadas no WhatsApp no Brasil são entre duas pessoas”, escreveu o executivo. “E, pelos limites que temos ao tamanho dos grupos, uma única pessoa precisaria criar perto de 4.000 grupos para atingir 1 milhão de pessoas.”

Daniels também citou o limite de encaminhamento, criticado por Bolsonaro. A mudança, que, segundo o executivo, foi um teste, foi baseada “na ideia de manter o WhatsApp como um ambiente
para conversas privadas”, afirmou ele no artigo.

“Então não foi uma surpresa que, quando alguns políticos declararam na semana passada que lutariam para o WhatsApp aumentar o limite de encaminhamento de mensagens de 20 para 200 pessoas, outros pediram que o WhatsApp fizesse exatamente o contrário: limitasse ainda mais o encaminhamento de mensagens.”

“Quando você conecta mais de 1 bilhão de pessoas em países e culturas diferentes, você verá tudo de bom que a humanidade pode fazer, mas também algum abuso”, escreveu Daniels, acrescentando que é responsabilidade da empresa “amplificar o bom e mitigar o mau”.

O executivo então lista as medidas que o WhatsApp tomou para combater o que chama de “desinformação”. Entre elas estão as contas removidas por spam (segundo ele, centenas de milhares), rótulo de mensagens encaminhadas, mais controle aos administradores de grupos, parcerias com agências de checagem de fatos, campanhas de conscientização e encontros com autoridades.

“A luta contra a desinformação é um desafio permanente para a sociedade. Para avançarmos, precisamos de todos — de empresas de tecnologia à sociedade civil, governo e usuários. O WhatsApp está comprometido nessa batalha”, conclui o artigo.

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