Os limites nas relações entre empresas e empregados estão sempre em discussão no Brasil e no mundo. Quando a companhia americana Three Square Market anunciou que implantaria chip em seus funcionários, a repercussão mundial foi instantânea. Apesar das polêmicas, o presidente da empresa, Patrick McMullan, está confiante de que esta é uma tendência que veio para ficar e que os benefícios são grandes tanto para patrões e funcionários.
Em entrevista exclusiva para o Olhar Digital, o presidente da Three Square Market falou mais sobre o funcionamento da tecnologia, que tem o tamanho de um grão de arroz. O executivo revelou ainda que já há empresas brasileiras interessadas na implantação do chip e que algum representante pode vir ao Brasil em breve. Confira a seguir a entrevista completa com Patrick McMullan:
Funcionamento do chip e benefícios
A ideia da Three Square Market de implantar o microchip surgiu de uma parceria da empresa com um cliente localizado na Suécia. A princípio, a proposta era integrar o pequeno componente ao sistema de pagamentos da empresa norte-americana, que até então fabricava quiosques de autoatendimento para supermercados. No entanto, a tecnologia acabou tomando outro rumo.
“Uma conversa levou a outra e nós acabamos não só integrando ao sistema de pagamentos, mas também para o acesso de portas, deslocamento no edifício, login em computador”, conta Patrick McMullan, revelando outras funções do implante em sua mão esquerda. “Quando eu entro no prédio, digitalizo minha mão e o chip registra que eu estou no edifício. Ele automaticamente liga o Airplay com a minha música preferida”.
O pequeno chip implantado pela Three Square Marketing utiliza uma capa de vidro bio-compatível aprovada pelo governo dos Estados Unidos desde 2004. O componente não precisa de uma bateria, já que utiliza uma tecnologia passiva, que captura a energia do dispositivo de leitura. Cada módulo sai a US$ 295 (cerca de R$ 930), se implantado pela própria empresa norte-americana. Patrick McMullan defende que a adoção traz benefícios tanto para as firmas como para funcionários.
“Para os empregados: [as vantagens são] a conveniência, a segurança, a certeza de que a identificação deles não pode ser roubada. Para nós, como uma companhia, segurança é o principal. Nós somos uma empresa de tecnologia e nós temos que ter certeza que nossa informação está segura. Tudo o que estamos fazendo é focado em assegurar que as pessoas certas tenham acesso às coisas adequadas”, conta.
Segurança e privacidade de dados pessoais
Desde que as primeiras histórias sobre a implantação do chip começaram a ser publicadas, o assunto levantou diversos questionamentos ao redor do mundo. No entanto, o presidente da Three Square Market garante que a recepção foi tranquila entre os funcionários da própria empresa, que foram cobaias no experimento.
“Nós somos uma empresa de tecnologia, nós somos inovadores. Na verdade, foram os nossos funcionários que disseram: ‘Nós temos que fazer isso. Já vimos o que o que isso pode fazer e já sabemos o que pode acontecer’. Eles que chegaram e disseram que estavam empolgados”, relata Patrick McMullan.
Fora dos muros da Three Square Market, porém, os questionamentos foram maiores. Especialmente por conta da segurança dos dados e da possiblidade de rastreamento dos funcionários fora do horário de trabalho. Sobre isso, a empresa garante que as informações gravadas no chip são criptografadas e que só podem ser lidas e alteradas através do aplicativo especialmente desenvolvido para a função.
Quanto ao rastreamento, Patrick McMullan revela que os chips atuais não possuem nenhuma capacidade de identificar localização e nem tampouco reportar isso. “Todos estão preocupados com a privacidade e todos estão preocupados com o Grande Irmão. Isto não significa que rastreamos as pessoas e assim por diante. Se você está preocupado com privacidade, pegue o seu celular e jogue-o em uma lata de lixo porque você está sendo rastreado”, argumenta o executivo.
Em entrevistas anteriores, porém, o colega de Patrick McMullan e CEO da Three Square Market, Todd Westby, revelou que a empresa desenvolve uma nova versão com GPS integrado. Questionado pelo Olhar Digital, o presidente da companhia não negou os planos. “Nosso primeiro produto não terá GPS. O uso que as pessoas e empresas nos solicitaram não está relacionado com GPS. Nós vamos em algum ponto considerar isso? Sim, nós vamos. Eu vou te falar que isso vai ser no início de 2018”, disse.
Sobre o controle das informações inseridas no chip, a Three Square Market afirma que o poder estará nas mãos dos funcionários, que poderão decidir o que incluir ou não no componente. Além disso, a empresa revela que não pretende obrigar ninguém a fazer implantes que não queiram ou que não estão de acordo com as suas convicções pessoais e religiosas. Para esses casos, estão sendo desenvolvidos soluções alternativas.
“Se alguém não quer o chip nas mãos, pode usar uma pulseira. Nós também temos algo que é integrado a um relógio, mas que está em desenvolvimento precoce. Ele vai monitorar a frequência cardíaca e fazer inúmeras coisas, mas ao contrário do Apple Watch, ninguém será capaz de me encontrar”, diz Patrick McMullan.
Planos de expansão para o Brasil
Desde que ganhou conhecimento do grande público, a Three Square Market afirma que tem recebido contato de, pelo menos, duas a três empresas por dia interessadas na implantação. Alguns desses pedidos vêm de outros países, como Irlanda, Canadá, Nova Zelândia, África do Sul e da América Latina. No entanto, o Brasil parece ser um dos próximos mercados a receber atenção da companhia norte-americana.
“Só nesta semana, tivemos duas requisições do Brasil. Nós conversamos com as empresas e eu acredito que, nos próximos 60 a 90 dias, eu ou alguém irá ao país para se encontrar com esses potenciais clientes e mostrar-lhes a solução que estamos trabalhando”, conta Patrick McMullan, sem revelar informações sobre os potenciais clientes. No entanto, o objetivo desses seria a criação de escritórios ou campus inteligentes.
“Eles estão à procura de soluções para que apenas seus funcionários e pessoas autorizadas tenham acesso às suas redes”, conta. Segundo o executivo, a empresa já estaria desenvolvendo as soluções para os clientes brasileiros e enviando vídeos e materiais explicativos. “Estou confiante de que pelo menos um deles feche o contrato”, revelou Patrick McMullan.
Perguntado se acha que o chip encontrará resistência no país, seja por parte do governo ou dos próprios funcionários, Patrick McMullan afirma entender que a tecnologia ainda é algo e ainda incompreendida. “Se eu acho que teremos alguns desafios no Brasil e em outros lugares? Sim, nós teremos. Mas a coisa mais importante a salientar é que não é que o chip não está rastreando. Nós não rastreamos ninguém, não estamos pegando a informação, não somos donos da informação, nem sequer a armazenamos. Tudo é mantido pelo cliente”, diz.
Enquanto não chega por aqui, o implante começa a ser usado lá fora em outras áreas além do ambiente de trabalho. Nas próximas semanas, a Three Square Market deve ir ao Caribe implantar o chip em pacientes com demência, doença que interfere na memória e impede que a pessoa se conecte ao ambiente ao seu redor. A proposta é ajudar a equipe médica na identificação dos doentes e do seu histórico.
O uso da tecnologia para fins médicos também chamou a atenção de uma cadeia hospitalar dos Estados Unidos, mas há também empresas de outras áreas interessadas. “Temos uma companhia aérea, um banco, um governo estrangeiro que está trabalhando conosco para uma solução ativa. Temos um ramo dos militares aqui nos EUA com quem vamos nos encontrar. Então, há uma grande diversidade de clientes potenciais”, conta Patrick McMullan.