Com cinco Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) na mesa, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu manter a suspensão do repasse de dados dos clientes (nome, endereço e telefone) pessoas físicas e jurídicas para que o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) realize a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua.

O pedido foi feito pelo governo federal junto às empresas de telecomunicações por meio de uma medida provisória publicada em abril. A justificativa do governo federal é que com a pandemia do novo coronavírus, os pesquisadores do IBGE estariam impossibilitados de visitar pessoalmente os domicílios para recolher os dados – e por isso teriam que ser coletados por telefone para fins de “produção estatística oficial”. Desde sua publicação, a MP 954/2020 é alvo de críticas por colocar em risco o direito à privacidade.

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As ações foram propostas pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e pelos partidos PSDB, PSB, PSOL e PCdoB.  Por dez votos a um, os ministros entenderam que o texto da medida não garantia o sigilo dos dados. O repasse já tinha sido suspenso pela ministra Rosa Weber, “a fim de prevenir danos irreparáveis à intimidade e ao sigilo da vida privada de mais de uma centena de milhão de usuários dos serviços de telefonia fixa e móvel”.

O único voto contrário foi do ministro Marco Aurélio Mello, que afirmou que a medida foi justificada pela pandemia, e que o IBGE é “merecedor da confiança nacional”. O ministro ainda argumentou que cabe aguardar o exame da MP 954/2020 pelo Congresso Nacional, que apreciará a conveniência e a oportunidade da normatização da matéria.

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Em nota feita poucos dias da publicação da MP, o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), afirmou que “a transferência de dados pessoais das operadoras de telecomunicações para o IBGE não atende princípios básicos de privacidade previstos na Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), como a definição da finalidade específica e a necessidade para a transferência das informações”.

O Idec classificou como “extremamente preocupantes” algumas das lacunas observadas no texto da Medida Provisória. O instituto Data Privacy Brasil, que apresentou ao STF uma série de argumentos em apoio aos ADIs, afirmou que “a MP 954/2020 não apresenta claramente a finalidade da requisição dos dados, o que é agravado por se tratar das informações pessoais da maior parte da população brasileira”.

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Para o coordenador de pesquisas do Data Privacy Brasil, Rafael Zanatta, apesar da MP ter sido construída com base em algumas salvaguardas – como atribuir com o caráter sigiloso aos dados e fixar os prazos para que sejam disponibilizados e descartados – a medida tem problemas fundamentais.

O mais grave deles, de acordo com Zanatta, é a própria falta de confiança de que essas salvaguardas serão realmente respeitadas. “Não há, no texto, um mecanismo de supervisão, cuja responsabilidade, prevista na LGPD, caberia à Autoridade Nacional de Proteção de Dados Pessoais. Contudo, o governo federal ainda não a criou, mesmo depois de quase um ano da aprovação da lei”, lamenta o coordenador.

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